Últimos que serão Primeiros
O valor de nossos feitos não está nas proporções vultosas desses feitos:
Deus não olha para o volume,
Nem para a quantidade,
Mas para a qualidade.
Ele não quer o muito, quer o bom, quer o melhor. É preferível, pois, o pouco bom, ao muito regular.
▬ Nossas obras devem ser feitas com alegria e singeleza de coração:
Sem tédio,
Sem cansaço,
Sem intenção reservada.
A virtude exclui cálculos de qualquer espécie.
Todo o bem que fazemos importa no cumprimento dum dever contraído.
▬ "Fazei tudo que puderdes e dizei depois: somos servos inúteis, fizemos somente o que devíamos” – tal é a palavra do Evangelho.
É um erro exaurirmo-nos numa labuta febril e penosa, com o propósito de nos tornarmos mais merecedores aos olhos de Deus:
▬ "Misericórdia quero e não sacrifícios.”
▬ A vida, mesmo considerada sob o aspecto da existência terrena, é um dom precioso e como tal deve ser vivida:
Destruir-lhe o encanto natural,
Reduzi-la a uma série de atos forçados,
Transformá-la, enfim, num fardo que se arrasta penosamente, não é virtude, é delito.
Os reclusos do claustro,
Furtando-se ao convívio social,
Incompatibilizando-se com a natureza em todas as suas manifestações...
... Longe de se aproximarem do céu, como pretendem, distanciam-se dele; porque todo o móvel de seus atos se funda num requintado egoísmo.
O reino dos Céus é daqueles que se tornam como as crianças, diz o Mestre. Onde a simplicidade e a inocência da criança, nessa atitude estudada, nessa vida egoística, cujo único fito se resume na conquista duma grande recompensa.
A verdadeira virtude é aquela que a si mesma se ignora.
Os humildes jamais se julgam seres privilegiados.
▬ "Bem aventurados os simples de espírito, porque deles é o reino dos Céus” – reza o Sermão da Montanha.
Bem aventurados aqueles que fazem o bem e não se lembram de que o fizeram. A recompensa é sempre grande para os que nela não pensam, e é sempre mesquinha para os que a têm como móvel de seus atos.
Agir por amor, sem aflições, sem ânimo excitado, fruindo desse mesmo amor um doce e suave prazer – eis o ideal da vida.
Os que assim procedem são felizes.
O tédio e o mau humor jamais os atingirão.
Nunca se queixam de ingratidões, nem de cansaço.
Vivem com alegria de viver: não se esgotam, nem se consomem. Suas energias, tanto físicas como espirituais, são sempre renovadas, mantendo o equilíbrio geral.
Ao homem não compete fazer ajustes com Deus: cumpre-lhe amá-lo e obedecer-lhe.
Aqueles que prometem fazer isto ou aquilo, sob a condição de lhes ser concedida determinada mercê, desconhecem por completo o caráter da Divindade. Pretendem fixar a paga, estabelecer o galardão.
Insensatos! Deixai a Deus dar-vos o que bem entender, pois será sempre mais e melhor do que aquilo que concebeis em vosso egoísmo.
Não convém pedirmos a extensão dos nossos méritos:
▬ A Deus pertence esse mister.
Ninguém é bom juiz em causa própria. Trabalhemos com simplicidade, com alegria:
▬ Deus nos dará o que for justo.
Não convém, tão pouco, correr com o fito de ganhar dianteira, porque muitos últimos serão primeiros, e muitos primeiros serão derradeiros.
Eis o que nos ensina Jesus através da Parábola dos trabalhadores da undécima hora, incerta no Evangelho segundo Mateus, capítulo vinte.
Pedro de Camargo.