A coragem de ser eu
Quando o brilho da meninice espelhava avidez nos meus olhos,
preparei-me para a guerra, para os conflitos sem fim.
Bem que minha coragem foi e é fruto das espadas que afiei,
bom mesmo foi que apenas temperei o corte, as afinei para a luta,
mas nunca as utilizei na incisão insana, nem sangrei a carne,
somente as guardei dentro de mim.
E por um bom tempo... fiquei indefeso,
vivi escondido em uma rua descalça... na solidão das gerais.
Temia... me perder se ultrapassasse a esquina da minha rua,
em cautela voltava sempre correndo... o inusitado me atemorizava,
presumia em alucinação ser vencido pelo caminho, que extenua.
E em desespero fazia do medo um refugio, do meu quarto um abrigo,
fiquei apavorado com o mundo, com a avenida desconhecida,
com a praça esquecida, com os becos adormecidos e outras vicinais.
E assim o destino um dia me empurrou ao acaso, em descortesia,
não tive outra saída, arranquei de dentro... toda a agonia.
E na descoberta, vi que de bárbaro nada tenho, sou apenas um poeta,
combato apenas com a escrita, uma gramática discreta.
Quando o ofuscar da meninice foi embora,
e o existir, esfolou-me a alma, arranhou o sonho,
fiz de mim um crescer, um ser que se aprimora.
Tudo foi muito lento, mas, aprendi que vencer é a arte da teimosia.
Atrevido, tive um olhar para fora, em demasia,
depois, ternamente olhei para dentro... de mim, delineei outros lugares.
Saltei os muros que moderavam os meus vôos, e inibiam os meus olhares.
Avistei outras existências, novos paradigmas e maravilhei-me com tudo,
rompi o temor de me perder, joguei fora as armas, o escudo.
Eu, que quando menino temia me perder na própria rua,
já fui um cidadão do mundo... hoje, tornei-me um ser universal.
Envelhecido, aprendi a amar o que sou,
ter a coragem de ser eu,
como não ficarei aqui para sempre,
de mim... só o amor será imortal.
Ari Mota